21 de nov. de 2011

Menor compactação do solo e acesso a terrenos íngremes são inovações na colheita de cana

Uma proposta inovadora para o plantio e a colheita de cana-de-açúcar, cujo objetivo é aumentar a produtividade em campo e reduzir custos, está em gestação no Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), em Campinas, no interior paulista. Trata-se de uma máquina chamada de estrutura de tráfego controlado (ETC), capaz de executar todas as operações mecanizadas do ciclo agronômico da cana. O equipamento consegue atingir áreas íngremes que as colhedoras de hoje não alcançam. "A operação de colheita mecanizada como é feita atualmente utiliza basicamente a mesma tecnologia de 50 anos atrás, desenvolvida na Austrália”, diz o professor Oscar Braunbeck, da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Universidade Estadual de Campinas, coordenador do projeto da ETC. Uma das vantagens da nova máquina, atualmente em testes num laboratório que imita as condições de campo de uma lavoura de cana, é reduzir o tráfego na área plantada e, com isso, a compactação do solo, prejudicial para o crescimento das plantas nas safras seguintes. Enquanto a ETC tem uma bitola (distância entre as rodas) de 9 metros, as colhedoras atuais têm bitola de 1,6 a 2,4 metros. Em razão disso e de seu peso, elas só conseguem colher uma linha de cana de cada vez da plantação e provocam uma compactação de cerca de 60% da superfície do solo, que acaba prejudicando o desenvolvimento da cultura. “A compactação estimula a erosão e dificulta a entrada da água no solo”, diz Braunbeck. Os 40% de terreno por onde as máquinas atuais não circulam são a área preservada, em que a cana consegue produzir. “Com uma bitola mais larga, a área preservada para plantio chegaria a 87%”, compara Braunbeck. “Reduzindo o tráfego pesado nos canaviais, abrimos oportunidade para o plantio direto da cana, como é feito com os cereais.” A primeira versão do equipamento foi concebida para se adaptar à estrutura de mecanização atual. Assim, ele foi feito de maneira articulada, com tração e direção nas quatro rodas, braços que se recolhem para poderem ser transportados na estrada e frentes de colheita que se posicionam para colher seis linhas de cana, sendo duas de cada vez. A direção ficará a cargo de um piloto automático com GPS, que será supervisionado por um operador.

Terrenos íngremes - A ETC vai conseguir trafegar por áreas mais íngremes. “A primeira versão do equipamento que estamos desenvolvendo, por ser mais largo, consegue se manter estável em locais com até 19% de declividade”, diz Braunbeck. As colhedoras de hoje conseguem entrar em terrenos com declives de até 12%. “Acima disso, como são estreitas, tombam com relativa facilidade”, diz o engenheiro agrícola Guilherme Ribeiro Gray, ex-aluno da Fea-gri e um dos sócios da Agricef, empresa que participa do projeto. Fundada em 2005, a empresa ficou abrigada até 2008 na incubadora da Unicamp, a Incamp. A Agricef já teve três projetos aprovados na modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe), da FAPESP, e desde 2009 participa do projeto do CTBE, em que é responsável pelo desenvolvimento do módulo de colheita. Braunbeck ressalta que não houve evolução no sistema de manejo agrícola da cana na medida em que mudaram as exigências ambientais, econômicas e sociais. A colheita, por exemplo, embora tenha passado por um grande avanço com a proibição gradual da queima da palha da cana no sistema manual, ainda utiliza máquinas concebidas na década de 1950 na Austrália. “As máquinas para colheita de cana sofreram apenas algumas adaptações desde a concepção, enquanto a colheita de cereais teve grande avanço.” O foco nos cereais tem razão de ser. A área plantada com cereais no mundo é de cerca de 700 milhões de hectares, enquanto a cana ocupa 22 milhões de hectares. “A perda durante a colheita mecânica nos canaviais hoje está em torno de 10%”, diz Gray. Para efeito de comparação, a perda na colheita de grãos é de cerca de 1,5%. “Para reduzir os danos nos canaviais estamos propondo um princípio diferente do atual.” Em vez de uma colhedora que tem um divisor para separar as linhas dos canaviais – o que resulta em emaranhamento e quebra da cana –, a base da operação proposta é fixar a cana na máquina, depois disso ela é cortada na base, puxada e removida por tração para a parte superior, quando é picada em rebolos (pequenos pedaços) e transferida para o transbordo – veículo de transporte da cana. “O separador que fica nas laterais do equipamento é sincronizado com a velocidade de deslocamento da máquina”, diz Gray. Ele levanta o colmo (caule) para o mecanismo puxador – com correntes ou esteiras – pegar a cana. A ideia é mexer o mínimo possível com a cana antes de ela ser cortada, para reduzir os danos às soqueiras (raiz que fica na terra para rebrotar) e as perdas no campo. Quando os rebolos são transferidos para o transbordo, a proposta do projeto é colocar junto parte da palha e o restante ficará como cobertura do solo no campo. Essa cobertura ajuda a diminuir a temperatura do solo, controla as ervas daninhas e reduz a evaporação de água. Atual­mente, na maioria dos casos, toda a palha é jogada no solo, pois como ela tem densidade muito baixa o custo do transporte acaba ficando alto. A proposta é levar a palha de carona com os rebolos, picada em pedaços pequenos de forma que se acomode nos interstícios da cana. O projeto da nova máquina tem como empresa parceira a Jacto, indústria de máquinas agrícolas e veículos elétricos com sede em Pompeia, no interior paulista, e apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no valor de R$ 16 milhões. Em quatro anos o equipamento tem que estar testado e funcionando e a empresa parceira tem mais dois anos para colocar o produto à venda. Mais informações no site do CTBE.

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